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Não fui eu

  O mercado materno é um espaço que ainda precisa evoluir muito, assim como todos os “mercados”. Há uma exigência enorme em relação às mães e cria-se um ambiente extremamente competitivo, cruel. Há quem faça os trabalhos escolares dos filhos para mostrar seus dotes artísticos, deixando evidente que nem Michelangelo no auge dos seus sete anos era capaz de tamanha destreza. Há quem poste fotos de crianças limpinhas vestidas de branco pintando em um espaço todo organizado. Sem contar aquelas que fazem questão de ressaltar a inteligência superior de seu rebento. É difícil achar pares nesse ambiente hostil e a adversidade acaba dando asas a sentimentos controversos. Vou dizer aqui baixinho para ninguém ouvir, mas a maternidade já me fez vibrar com o “fracasso” alheio, apenas por ele não ser meu e ser de outra pobre mãe. Ri da mãe da Ana quando ela mandou a menina fantasiada pro colégio um dia antes do desfile de fantasia. Fiquei com dó da criança, aquela mãe podia ser eu, mas (ufa!) não

Dona Abstenção dos Brancos Nulos

  Depois do segundo turno das eleições municipais, estive analisando os votos em Porto Alegre e acho que é injusto o atual prefeito, reeleito, assumir o governo por mais quatro anos. Ainda que a disputa tenha sido entre ele e a candidata de oposição que desde o princípio todos sabíamos que não ganharia, pois ela defende justamente o que o “cidadão de bem” mais teme (que ele nem sabe o que é direito) e ainda por cima teimou em nascer mulher, nenhum dos dois obteve a maior parte do apoio popular. A grande vencedora dessa eleição foi a descrença na política. Abstenções, nulos e brancos totalizaram 436.025 votos, quase 30 mil votos a mais que o primeiro colocado, o comandante do Titanic portoalegrense. Levando isso em consideração acho que em 01 de janeiro de 2025 a capital deste estado que já foi protagonista da vanguarda política brasileira, símbolo de resistência, deveria empossar Dona Abstenção dos Brancos Nulos. Pensa na representatividade que essa governante teria? Presta atenção n

A cidade de palha

  Falemos sobre Prático, Heitor e Cícero, sim os três porquinhos. Se bem me lembro quando mamãe porca cansou de sustentar os pequenos suínos abusados, Cícero o mais preguiçoso do trio de leitões, decidiu construir uma casinha de palha, negando os perigos da floresta. Heitor, um pouco mais consciente, mas nem tanto, construiu uma casinha de madeira, enquanto Prático fazendo jus ao seu nome decidiu não ter problemas futuros e construiu uma casinha de tijolos, um empreendimento sólido. Então o lobo mau que vivia na floresta sendo único e exclusivo meliante de toda a redondeza, que sorte tinham os habitantes da mata, viu as edificações novinhas e cobiçou, não as propriedades em si, mas as carninhas tenras que as habitavam. Sorrateiro chegou na casa de Cícero anúncio o crime, deu meio assopro e a mal enjambrada edificação foi pros ares, voou como palha literalmente, o pobre porquinho gritou, gritou, correu, correu e se escondeu na casinha de Heitor, tenho quase certeza que ele não foi dir

Calvino esteve na FLIP

Estive na FLIP (Festa Literária Internacional de Paraty) pela primeira vez. Mais fiz acontecer do que desfrutei dela propriamente dita, mas é impossível não ser enfeitiçada pela magia literária que lá paira. Não fossem as pedras portuguesas nos colocarem em plena atenção, talvez flutuássemos pelas ruas, ainda que às vezes avistemos um ou outro alçando voos curtos pela cidade e se estabacando de forma dolorida e vexaminosa. Quase admirei a coragem dos ébrios que por ali andavam e não eram poucos. Foram dias quentes, mesmo quando chovia. Foi um mundaréu de gente, um turbilhão de informação, difícil acompanhar e absorver. Em meio a efervescência cultural e histórica, no duplo sentido da palavra, em uma manhã quente, daquelas que o sol já sai chamuscando a pele exposta, me postei em uma fila da padaria cedinho. Sim, porque há uma programação intensa, público e filas imensas. Ali parada sob a quentura em busca de pão e água gelada para completar o download da alma iniciado com um café preto

Gincana de Gente Grande

  É semana de gincana escolar em um colégio classe média média, ou seja, classe baixa premium, desprovida de consciência. A primeira tarefa das turmas é arrecadar a maior quantidade de tampinhas de garrafa pet possível. O objetivo, ajudar uma instituição de caridade. Lido mal com caridade, curto mais justiça social, mas vamos lá incentivar a criança a arrecadar tampinhas. Percebo através da agitação do grupo de whatsapp de pais que a competição é séria, brincadeira de gente grande. Mães em descontagiante força tarefa para ter a maior quantidade possível dos engasgadores de tartarugas. Olho para nossa meia dúzia de tampinhas, honestamente arrecadada por uma saltitante criança de 7 anos, percebo que vou ter que tomar uma atitude. Por sorte, consigo com uma amiga uma bombona de 5 litros quase 100% recheada de tampinhas. Eu não tinha lido, mas é preciso entregá-las em garrafas de 5 ou 6 litros e só são aceitas as cheias. Chega o dia da entrega, a escola provinciana está em polvorosa, com

Mistura perfeita

Poucas coisas abatem uma mãe, mas ninguém é de ferro e acredito ser unânime no mundo materno, uma das maiores tragédias cotidianas que podem se assolar sobre uma família é a máquina de lavar roupa estragar. Pois bem a minha estragou! Em 7 anos ela nunca tinha feito isso comigo, mas começou a botar água pra fora e não parava. Não teve nem a decência de dar problema em uma segunda-feira pela manhã, foi logo se estrebuchar em uma sexta-feira feriado. O desespero quis tomar conta de mim. Tive vontade de me atirar na montanha de roupa e chorar em posição fetal, mas lembrei do cheiro dos uniformes escolares e preferi manter a compostura. Fui pro google tentar achar alguém que me salvasse, não consegui nada. Então me ocorreu que aquele grupo de pais do whatsapp, que tem majoritariamente mães, serviria para alguma coisa além de dar treta e pedi ajuda: Gente, situação calamitosa! Minha máquina de lavar roupa estragou! Em poucos minutos eu tinha contato de 5 técnicos. Seu Machado foi o prime

20 de setembro

  Uma amiga saiu assustada de uma palestra, quando o conferencista revelou que nós nascidos no século passado, mesmo aqueles do final do século, somos geracionalmente muito mais próximos de alguém que nasceu na década de 1950 do que alguém que nasceu depois dos anos 2000. Tudo que veio depois de não ter acontecido o bug do milênio foi tão social e tecnologicamente impactante que estamos muito mais perto da moça sexy, feliz do anúncio de batedeira do que de qualquer um que nasceu depois que a internet se popularizou e passamos a ter literalmente o mundo na palma da mão se assim quisermos. A quantidade de informação, de imagem que nos atravessa hoje é completamente distante da vida consultando a Barsa. Essa semana quando aqui no Rio Grande do Sul comemoramos (sim, há questionamentos nisso) a Revolução Farroupilha essa distância para mim fica ainda mais evidente. Meu pai e minha mãe nunca foram gaúchos de carteirinha, tradicionalistas, mas eu cresci com churrasco aos domingos, danças tr