Não fui eu
O mercado materno é um
espaço que ainda precisa evoluir muito, assim como todos os “mercados”. Há uma
exigência enorme em relação às mães e cria-se um ambiente extremamente
competitivo, cruel. Há quem faça os trabalhos escolares dos filhos para mostrar
seus dotes artísticos, deixando evidente que nem Michelangelo no auge dos seus
sete anos era capaz de tamanha destreza. Há quem poste fotos de crianças
limpinhas vestidas de branco pintando em um espaço todo organizado. Sem contar
aquelas que fazem questão de ressaltar a inteligência superior de seu rebento.
É difícil achar pares nesse ambiente hostil e a adversidade acaba dando asas a
sentimentos controversos.
Vou dizer aqui baixinho para ninguém ouvir, mas a
maternidade já me fez vibrar com o “fracasso” alheio, apenas por ele não ser
meu e ser de outra pobre mãe. Ri da mãe da Ana quando ela mandou a menina
fantasiada pro colégio um dia antes do desfile de fantasia. Fiquei com dó da
criança, aquela mãe podia ser eu, mas (ufa!) não era. É difícil descrever o
alívio que senti quando coloquei a folha da lição de casa no lixo, precisei
humildemente pedir uma nova pra professora e ela não tinha mais para me dar,
porque bem antes de mim a mãe do Pietro, a do Gabriel e a da Catarina já tinham
perdido. Não consegui disfarçar minha satisfação no dia que era para levar
revista pro colégio para uma atividade de recorte e eu descobri que quem mandou
a revista com uma mulher pelada foi a mãe da Sofia e não eu. Quando soube dos
nudes fiquei nervosa porque achava que tinha mandado uma de decoração de
banheiro, mas entre azulejos e pornografia a diferença é tão sútil que eu
poderia ter me confundido.
Reconheço a ausência de nobreza em meu
sentimento, mas nessas horas para reconfortar meu cérebro de comportamento
duvidoso, me lembro de um trecho de um livro da Isabel Allende, A soma dos
dias, que ela revela as profundezas da natureza humana quando conta da sua neta
que chegou da escola feliz, ela perguntou o que aconteceu e a menina de 7, 8
anos, desajeitada, alvo de chacota, respondeu: fulana caiu e quebrou o dente.
Ela, então, questionou o que tinha de feliz nisso? E a menina respondeu: que
não fui eu.
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