A beleza da crise climática

 

Sete da manhã, sol querendo raiar pra surpresa da chuva cotidiana. Eu e minha filha esperamos a van escolar. Depois do nosso ritual matinal de fazer tudo correndo, nos postamos na calçada com folga no relógio e ouvimos a cidade amanhecer. Contamos com a companhia das caturritas que conversam loucamente e parecem bem mais acordadas do que nós, aquele dia parecia normal até sermos todas surpreendidas pelo voo de um forasteiro. Um pássaro diferente, imponente, de asas e rabo grande. Um estranho na nossa rua e nas nossas árvores, ele voava dando rasante, se exibindo. Talvez, fosse um refugiado climático. Não seria o primeiro, esses dias vi um gavião agindo com naturalidade na pracinha, quase avisei as donas de pinscher e shitzu, mas achei que não mereciam, dada essa moda de andar com cachorro sem coleira, um sequestro de gavião poderia ser educativo.

Mas voltemos ao outro estrangeiro no nosso espaço, que eu só sei que era um pássaro, não sei nome científico, nem apelido. Independente dos pensamentos intrusivos sobre o desequilíbrio ambiental que se instalavam na minha mente já no alvorecer, não podia negar que o bicho era bonito, o rabo se assemelhava a um leque preto. Às vezes há beleza até no caos.

Parecia que ele sabia que estava sendo admirado, voava como quem dança (ou talvez só tivesse incomodado por não estar em seu local habitual). Lá pelas tantas ele pousou em um galho bem na nossa frente. As caturritas pareciam ofendidas com aquela invasão na árvore delas.  Nós, embevecidas, tivemos a ideia de fotografar o bicho pra mais tarde descobrir quem era ele, de onde vinha, quem sabe colocá-lo em um stories com uma mensagem motivadora de bom dia. Quando minha filha posicionou o celular e clicou na tela, o belo pássaro, em um movimento que daria inveja a seleção de nado sincronizado, com sua bazuca anal, como já diriam os Mamonas Assassinas, fez cocô e eternizou esse momento em nossas contas google.

Naquela manhã de um dia qualquer, o belo espécime de uma ave que eu não sei qual era, nos mostrou, através da dança de quem está apertado para ir ao banheiro e não conhece o local, toda a beleza da crise climática.

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