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Mostrando postagens de julho, 2024

A beleza da crise climática

  Sete da manhã, sol querendo raiar pra surpresa da chuva cotidiana. Eu e minha filha esperamos a van escolar. Depois do nosso ritual matinal de fazer tudo correndo, nos postamos na calçada com folga no relógio e ouvimos a cidade amanhecer. Contamos com a companhia das caturritas que conversam loucamente e parecem bem mais acordadas do que nós, aquele dia parecia normal até sermos todas surpreendidas pelo voo de um forasteiro. Um pássaro diferente, imponente, de asas e rabo grande. Um estranho na nossa rua e nas nossas árvores, ele voava dando rasante, se exibindo. Talvez, fosse um refugiado climático. Não seria o primeiro, esses dias vi um gavião agindo com naturalidade na pracinha, quase avisei as donas de pinscher e shitzu, mas achei que não mereciam, dada essa moda de andar com cachorro sem coleira, um sequestro de gavião poderia ser educativo. Mas voltemos ao outro estrangeiro no nosso espaço, que eu só sei que era um pássaro, não sei nome científico, nem apelido. Independen...

Analogia da vaca

  Você já parou pra pensar a fundo que o mundo anda poluído de tudo? De sujeira, de plástico, de gás, de partículas, de informação, de conexão, de comunicação, de gente, de imagem, de som. É tudo muito junto, misturado, girando, como que em um imenso liquidificador. Tem horas que me sinto como aquela vaca do filme “Twister”. Eu, a simpática ruminante, rodopio velozmente no ciclone, o mundo. Me lembro que quando vi o filme com meu primo em 1996 fiz várias piadas com o absurdo da vaca voando, mas cá estou eu me identificando com a bovina graciosa. Eu giro. Tudo gira. Abrimos diariamente mil abas nas nossas cabeças e dar continuidade é difícil. Aprofundar-se em algo é um desafio. Ler sem o pensamento voar é um exercício. Ver um filme inteiro sem nenhuma paradinha pra nada, sem nem uma espiadinha no celular, nem que seja para olhar o horário é um duelo com o dedo nervoso, que fica querendo clicar em tudo, buscando uma luzinha, quase dizendo “ET telefone minha casa”. Atire a primeir...

Nóis Trupica e cai

  Pertenço há uma rara linhagem de pessoas que caem, é raro, mas acontece com frequência as quedas e o número de integrantes desta cepa. Minha avó caía, minhas tias caíam, minha mãe cai, minha prima cai (e me conta só uma semana depois quando já passou a vergonha), eu caio. Definitivamente não pertencemos ao grupo que trupica, mas não cai. Nós seres elevados, caímos de nossas próprias alturas. O pior é que casei com uma pessoa, cuja mãe também pertence a essa linhagem dos tombos inexplicáveis. Começo a chegar à conclusão que as chances das minhas filhas se manterem não vertical ao longo de suas vidas são ínfimas. Essa semana mais uma vez caí, tal qual uma picanha na balança, enquanto caminhava pela rua e cheguei a várias conclusões. Primeira, a dor moral, na maioria das vezes, é muito maior que a física. Segunda, tombo não se explica, se cai. Toda vez que quem caiu ou quem viu o tombo tenta explicar aquilo parece inexplicável, uma desfragmentação do ser. Terceira, as pessoas que ...

Categorias de Home office

  Você sabia que home office não é tudo igual? Existem categorias no trabalho feito de casa. Há o home office tradicional, amplamente divulgado, o home office de pai e o home office de mãe. O pai que faz home office, geralmente tem um espaço privado na casa, onde faz suas reuniões que parecem conferências com Biden no início do mandato. Às vezes conta com a companhia de um gato deitado no computador aproveitando o quentinho. Eventualmente o bichano come os fios dos eletrônicos. Ali naquele espaço as crianças sabem que não devem entrar. Do lado de fora daquele bunker profissional quase sempre tem uma mãe inconscientemente perpetuando o desbalanço da sociedade patriarcal, dizendo: Não entra aí! Papai tá trabalhando! Não grita! Papai tá trabalhando! No entanto, a porta não é intransponível, vez ou outra uma cria entra, faz uma intervenção, se comunica com os conferencistas de Biden, o que a certa medida humaniza aquele ser distintamente vestido da cintura para cima. Muitas vezes ele...