Estava em promoção

 

Passava eu por uma daquelas semanas que a gente pergunta, se alguma coisa pode piorar e logo a vida resolve te testar e dizer: Sim, sempre podemos deixar essa bagaça pior! Um inferno astral com requintes de crueldade, que a mais cética das céticas, começava a se questionar se aquilo era inferno astral ou jogos vorazes. Daquelas épocas que a adepta do chá de camomila e da erva cidreira relutantemente assume que clonazepam tem seus encantos e recebe o conselho da própria psicóloga que talvez dobrar a dose possa ajudar a ter um sono de melhor qualidade, ou apenas um sono.

Quando já me sentia saindo do olho do furacão, quando a vaca do Twister não girava mais a minha volta, mas o vento ainda era violento entrei no supermercado para comprar esponjinha de louça, só esponjinha. Assim que empurrei meu carrinho pelos primeiros metros do estabelecimento, fui tomada de assalto por uma promoção de vinhos. O ataque me pegou tão desprevenida que quando eu menos esperava estava com 9 garrafas confortavelmente aguardando que eu fosse a sessão de esponjinhas para acomodá-las. Era uma daquelas promoções leve 3 pague 2, não pude resistir e como 9 é múltiplo de 3, lá estavam elas deslisando com elegância rumo ao o meu lar. Considerando que vinho vem da uva, podemos concluir que ele conta como fruta na pirâmide alimentar, minha pseudo-sapiência me iludia, passando pano pra mim mesma. Só o que eu precisava fazer era comprar o vinho e não tomar o clonazepan, afinal a de não se misturar as drogas lícitas.

Mostrando todo o meu domínio sobre a situação e meus problemas de forma geral eu e meus vinhos fomos ao encontro das esponjinhas, que também estavam em promoção. Comprei logo quatro pacotes o que me liberaria de comprar espojinhas por um bom tempo. Em relação aos vinhos, talvez eu não pudesse dizer o mesmo com tanta propriedade. Cheguei em casa as crianças me ajudaram com os pacotes. Não deixei ninguém carregar os vinhos com medo que derrubassem minhas amadas garrafas no chão.

Passados alguns dias fui ao supermercado de novo, dessa vez junto com as pequenas, comprar verduras e perguntei para minha filha mais velha:

- Compramos tudo?

- Acho que sim! - Ela responde.

Ao que a minha filha mais moça diz em alto e bom tom:

- Sim, vinho tu não precisa! Acho que comprou uns 20 quando foi aquele dia na farmácia.

Eu, minha filha mais velha e uma outra mãe que estava ao nosso lado com seu filho, um menino gordinho de bochechas rosadas de uns 3 anos, rimos alto. Eu respondi para a pequena.

- Minha filha, vinho não vende em farmácia, embora devesse vender.

Ela seguiu no assunto e perguntou:

- Mas mãe porque tu comprou tantos vinhos aquele dia?

- Porque estava com uma promoção boa e pra sobreviver….

Ao que a mãe do gordinho das bochechas cor de beterraba ao lado complementa:

- ….até o final do ano, porque a vida não tá fácil!

Rimos, um riso meio nervoso, quase brindamos com garrafas fechadas recém-retiradas das gôndolas.

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