Que mulher era Deise!

 

Depois de uma gata de estimação, não mais tão estimada, fazer xixi no modem e me obrigar a mentir para a empresa de internet e TV que o aparelho havia queimado devido a uma descarga elétrica, ainda que o odor de urina entranhado no eletrônico teimasse em me denunciar, contei com a compreensão de um técnico gateiro que fez vista grossa e gentilmente trocou o aparelho sem fazer muitos questionamentos além de perguntar se tínhamos gatinhos.

O problema do modem foi resolvido. Na euforia de voltar a estar conectados com o mundo só reparamos dias depois que a nossa TV não era mais a mesma. O aplicativo da Disney não funcionava direito e só quem tem crianças em casa sabe a tragédia do home office sem a companhia das princesas, da Minnie e da Bluey. Liguei novamente para a empresa que presta o serviço, expliquei que desde que o técnico havia trocado o modem o aplicativo não funcionava mais. O moço que me atendeu me tratou como normalmente os atendentes de call center atendem as pessoas, com uma má vontade singular. Me pediu pra fazer tudo aquilo que a gente sabe que não funciona. Desliga todos os equipamentos da tomada, conta até sessenta, religa e nada volta a funcionar. Qualquer ser humano que tenha contato com essa tecnologia há mais de dois minutos já sabe que a primeira atitude é desligar tudo da tomada, por isso o faz antes de respirar fundo e se munir de coragem para ligar para o teleatendimento. O moço dizia que tinha feito uma atualização remota e logo os serviços voltariam a funcionar normalmente. Me pergunto se ele realmente acredita que volta a funcionar? Porque todos nós sabemos que nunca da certo.

Passei mais de um mês sem ouvir "Cinderela, Cinderela, noite e dia Cinderela", simplesmente entoei o mantra "Let It Go", mas chegou um momento que até eu começava a sentir falta da voz chata da Minnie Mouse. Me armei de coragem, liguei de novo pro teleatendimento. Assim que uma moça atendeu eu disparei, sem dar tempo pra ela pensar, como quem aborda uma vítima de assalto:

- Minha tv tá com problema pra conectar o app da disney e tu não vai me pedir pra ligar e desligar tudo da parede, porque nós duas sabemos que isso não vai funcionar, eu preciso de um ser humano que venha mexer no aparelho!

Só faltei dizer “não olha pra trás e caminha normalmente”. Deise, era o nome da minha vítima, achou minha abordagem no mínimo inusitada, riu e disse com seu sotaque recifense gingado:

- É tem coisas que só um ser humano mexendo no aparelho resolve! Vou abrir seu chamado.

Me pediu pra confirmar meus dados, confirmei e com uma habilidade nunca antes presenciada por mim em uma ligação de call center Deise me tirou da defensiva. Quando viu no meu cadastro que eu era de Porto Alegre perguntou se tava muito frio. Me confessou que tinha vontade de conhecer o Rio Grande do Sul, mas tinha medo de frio. Perguntou se eu era grêmio ou inter. Falei que eu era gremista não praticamente. Falamos mal do futebol, do tanto que os jogadores ganham de dinheiro e nós reles mortais ralamos a vida inteira pra não ganhar nem um terço do que eles ganham em uma partida. Deise me contou que experimentou chimarrão uma vez, mas não gostou, em contrapartida amou polenta. E assim depois de vinte minutos, fazendo de conta que o sistema nem era lento, Deise me entretendo enquanto fazia minha solicitação, ela conseguiu transformar meu assalto em um quase caso de amor. Sem me pedir nenhuma vez pra desconectar o modem da parede, me arranjou uma visita técnica para segunda feira às 08h30 da manhã, ainda me perguntou se eu não ia ficar com preguiça de acordar cedo no frio.

Que mulher era Deise!

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