Um dia de Croods

 

O vento zunia, a chuva não parava. No fim da noite as luzes apagaram. O ciclone tinha chegado, é raro, mas acontece com frequência A casa parecia que ia levantar voo, ainda bem que é a casa depois da reforma, antes da reforma talvez ela tivesse realmente levantado voo.

Dormi, não dormindo porque por mais que a gente saiba que está em um lugar seguro os barulhos da tempestade não são agradáveis, os olhos desacostumaram da escuridão completa. É estranho não ter nenhuma luzinha do aparelho de televisão ligada, nenhum celular dando uma piscadela.

O dia amanhece, temos certeza que em nossa fortaleza nada aconteceu. Vou no banheiro e instintivamente aperto o interruptor da luz que não liga, pra me lembrar que não tem energia. Então, vem aquela necessidade de passar um café pra começar o dia, coloco o pó e a água e me dou conta que a cafeteira é elétrica.

Decido mandar mensagem para a companhia de energia para saber a previsão de retorno. Não tem sinal no celular. Saio na rua de roupão, chuva fria caindo, umidade daquelas que invade os ossos. Consegui um pauzinho de sinal, envio a mensagem. Antigamente poucos segundos depois vinha a resposta avisando em quanto tempo seria restabelecido o serviço, agora a companhia foi privatizada “pra melhorar”, então a resposta que recebo é que não compreenderam minha solicitação. Decido ligar porque estou determinada, quase subo de pijama e roupão, agora molhados, em uma das árvores que não foram derrubadas pelo vento. Consigo sinal suficiente para ligar, o serviço de excelência de uma empresa privada, sem concorrência, chama uma vez atende e desliga na minha cara. Tento de novo e a a coisa se repete. Uma espécie de fod@-se cliente refém, quando der a gente resolve e o quando só cabe a nós sabermos. O que não tem solução, solucionado está. Parte de mim se conforma com minha desconexão totalmente conectada ao sistema econômico e social do século 21.

As crianças acordam e ficam magoadíssimas porque não foram pra aula. Estamos em junho e quase todos os dias desde fevereiro uma delas vai empurrada pro colégio, porque nunca quer ir e hoje, justamente hoje, surgiu uma vontade incontrolável de ser uma aluna aplicada e isso envolve lágrimas, lamento e tristeza. A que gosta de ir ao colégio me diz insistentemente que hoje era o dia mais legal. Algo me diz que qualquer dia que elas não fossem por motivo de força maior seria o dia mais legal de todo o ano. O bom da vida é ser “do contra”. Superado os queixumes, elas me olham e perguntam, mas o que vamos fazer hoje? Ao que eu respondo: brincar de Croods*! Dito isso peguei um fósforo e fui ligar o fogão pra passar um café como os antigos faziam, feliz porque não preciso esfregar pedaços de madeira.

*Croods = filme de animação sobre uma família pré-histórica.

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