A vergonha das unhas não aparadas

 

Quando os filhos iniciam a vida escolar, nós, pais, aprendemos que a comunicação da escola conosco será feita através da agenda. Salvo questões mais urgentes que demandam uma ligação, ou coisas mais graves que demandam uma reunião, a comunicação se dá por esse meio. Ali temos informações como, no caso dos pequeninhos, se comeram ou não, se fizeram cocô, se caíram, o que estudaram. No caso dos maiores somos informados sobre passeios escolares, se esqueceram de entregar o dever de casa ou qualquer aviso que tenham a nos dar. Assim, como cabe a nós pais escrever na agenda qualquer coisa que a escola precise estar ciente. Há escolas que já tornaram as agendas eletrônicas, não é o caso das instituições que minhas filhas frequentam.

A minha filha mais velha muitas vezes chega em casa avisando: Tem bilhete, mas não é nada ruim! Isso significa que ela não aprontou nada, nem esqueceu de fazer nenhuma atividade. O que é comum porque ela costuma ser uma estudante bem dentro da linha.

Já a mais moça, como tem só cinco anos, é preciso chegar em casa todo dia e ler a agenda para saber como foi o dia dela. Eis que semana passada abro a agenda e tem um bilhete meio padrão da escola pedindo que eu cortasse e mantivesse limpas as unhas da fofura para evitar acidentes entre ela e os colegas.

Eu roo unhas desde que me conheço por gente. Minha filha mais velha rói unhas desde que se deu conta dessa possibilidade, nunca precisei me preocupar que ela estivesse com as unhas grandes. Agora a pequeninha que ser diferente, quer ser a zen da família e não sofrer dessa ansiedade que nos assola e faz com roamos nossas unhas até o sabugo! Era só o que faltava! A diferentona!

Me sentindo um pouco a pior mãe do universo, assolada por uma vergonha que só uma mãe é capaz de sentir quando tem um descuido, um desleixo em relação ao seu filho, fui olhar as unhas e ela me disse:

  • Mamãe, minhas zuinha tão enomes!

Peguei um cortador, não tava a unha do Zé do caixão nem nada, mas passava a linha do dedo de fato, e sim estavam sujas. Enquanto cortava e fazia a limpa, pensei em falar sobre política nacional pra ver se ela sente um pouco dessa ansiedade toda e colabora comigo “cuidando” das próprias unhas como a irmã sempre fez. Aliás, talvez a irmã tenha começado a roer unha quando assistiu a votação do impeachment da Dilma comigo.

Acho que precisarei colocar um despertador para lembrar de cortar as unhas da pequena pessoa. É muito para a cabeça de uma mãe só. Precisamos estar bem informadas, entender do preço do brócolis à necropolítica, saber um pouco das principais teorias de educação, ficar bonitinha, entrar em forma, compreender que a velocidade da informação acelera o tempo, ser economicamente ativa, lutar contra o patriarcado, fazer almoço, lavar roupa, lembrar da pirâmide alimentar, estar presente em ao menos uma rede social, saber a diferença entre vírus e bactéria, mais um tantão de coisas que nem cabe aqui e de quebra ainda lembrar de cortar unhas!

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