Continuidade


É um bagulho doido esse negócio de ano novo. Chega um dia que o ano acaba pra começar outro. É meio que uma prestação da vida, a gente divide em 12 parcelas e quando termina tá pronta pra iniciar um novo.

Na real nada acaba, tudo continua. Tanto que no dia seguinte boa parte dos adultos estão de ressaca. Eu que sou bem normal, embora bastante crítica, especialmente auto crítica, também me animo com o último dia do ano como se ele fosse sinal de finitude de algo. Posso até chegar ao dia 31/12 bem cética, mas depois  do segundo cálice de espumante começo a ficar esperançosa.

Esse último réveillon não foi diferente. Depois da segunda, talvez terceira taça de espumante, lá pelas 23h, eu já estava considerando o dia seguinte um início de qualquer coisa e animadamente começava a enviar, pelo whatsapp, figurinhas de barbies brindando para alguns e de feliz dois mil e lula para outros, quando minha filha mais moça me chamou para a realidade:

- Mamãe quero vomitar!

Pensei: isso que é solidariedade, eu bebo e ela vomita! Corremos pro banheiro, eu e aquela figura fofa que tem quatro anos e meio, mas ainda guarda um formato agradável de bebê. Segurei o cabelo dela e ali ficamos uns minutinhos. Nada de vômito.

Achei que talvez não fosse enjoo genuíno, se é que há essa categoria de mal estar. Talvez fosse a ansiedade por ouvir fogos, por ficar até tarde acordada, por comer desregrada por uma semana. Voltamos para o pátio onde estava apenas nosso núcleo familiar mais próximo, peguei minha taça de espumante e dei mais uns goles. Meu whatsapp fez um daqueles barulhinhos que geram ansiedade e fui olhar do que se tratava. Era mensagem de uma amiga recente, uma grata surpresa que as máscara e 2021 me deram. Toda feliz, li o que ela tinha escrito, tudo personalizado, nem era só figurinha pronta e quando eu ia responder minha filha mais uma vez me chamou para a realidade:

- Mamãe quero vomitar!

Dessa vez não saí correndo, saí caminhando me preparando para ficar mais uns minutos no banheiro e não acontecer nada. Fui respondendo a mensagem. 

Agora um aviso: Não façam isso é quase como digitar e dirigir. 

Chegamos no banheiro, eu distraída no celular e o acidente se deu! Não deu tempo de abrir a tampa da privada, nem nada. A pobre criança vomitou o banheiro inteiro. Dava até para escrever no vômito como um lembrete: só é dia 31 de dezembro, nada muda se o mundo inteiro não mudar.

Fiquei automaticamente relativamente sóbria, chamei a minha fiel escudeira e dinda das meninas e fomos lá. Eu limpar o banheiro e ela a criança. Antes da meia noite a pequena, que devia ter tomado um porre de refrigerante e comidas com as quais não está acostumada, já dormia pronta para o outro dia, que era o outro, mas era somente uma continuidade do anterior. Eu como ainda não atingi essa maturidade que as pessoas de 4 anos e meio tem, voltei a comemorar como se algo se findasse, apenas para no dia seguinte ser acordada pela minha filha mais velha às 5h30 min da manhã reclamando de dor de ouvido e me lembrando da continuidade. Levantei, fui no banheiro fazer xixi e ainda tinha resquícios de cheiro de vômito do ano anterior.


Comentários

  1. Oi, Mal! Para os muito realistas, céticos e chatos, que adoram achar que nada vale a pena, sugiro um remedinho e cama. É impossível (exagero), não se contagiar com a mudança de ano, e as esperanças de um ano novo melhor. Até porque saímos da apatia e sorvemos a energia obrigatória que está no ar. Até porque depois da terceira dose, tudo se transforma. Até porque desejamos esperar.

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  2. Beijo pra todos aí. Um dia desses podemos beber juntos.

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