Mamãe é amiga do Papai Noel

 

Criar e conduzir pela vida seres humanos é uma das tarefas mais difíceis existentes. Há muita teoria, mas como tudo, teoria é uma coisa e a prática pode ser bem diferente por inúmeros motivos e variantes envolvidas. O interessante desse caminho que percorremos como mães e pais é que a virada de teóricos para práticos faz com que a gente pague pela boca. Antes de ter minhas filhas eu muitas vezes julguei mães e pais. Teorizei o que faria ou não quando tivesse os meus. Minhas filhas nasceram e eu já fiz inúmeras coisas que eu julgava errado, já fiz outras tantas que jurei que não faria.

Uma das coisas que eu pensava jamais fazer era alimentar a ideia da existência de seres mágicos como Papai Noel, Coelhinho da Páscoa e afins. No primeiro natal da minha filha mais velha eu já tava lá na fila do shopping esperando pra tirar foto com o “Papai Noel” e não era qualquer Papai Noel, eu conhecia ele. O Papai Noel que eu a levava para tirar fotos era, durante todo ano, motorista de um lugar onde eu trabalhei e em dezembro tirava férias para ser Papai Noel. Imagina o significado disso para uma criança? Não era só um Papai Noel, era o Papai Noel que conhecia a mamãe e sabia o nome dela. Pensa no simbolismo disso?!

Conforme ela foi crescendo eu me dei conta que essa minha relação próxima com o Papai Noel poderia ser mais benéfica do que eu imaginava. Em situações de extrema necessidade eu podia dizer: Vou mandar um whatsapp para o Papai Noel! Não havia dúvida que eu tinha o número dele, afinal ele me encontrava, me abraçava e me chamava pelo nome.

Não me orgulho disso, mas confesso que por vezes me utilizei, em última instância, desse recurso. Como eu já disse, entre teoria e prática, lógica e razão, consciência e falta dela há uma distância enorme. No entanto, chegou determinado momento que a minha filha começou a achar que considerando a relação próxima que eu tinha com o Papai Noel ela poderia se beneficiar disso também e passou a pedir presentes de natal impagáveis. Nessa época, quando ela tinha quase cinco anos, fui obrigada a começar a desfazer o mito do bom velhinho que eu mesma criei. Primeiro disse pra ela que a mamãe e o papai precisavam dar dinheiro pro Papai Noel comprar o presente e daí pra frente a história veio à baila.

Logo ela se deu conta que não existia Papai Noel e talvez, por se sentir traída, não por mim especificamente, mas por uma sociedade inteira, ela assumiu como missão de vida contar para todas as crianças que o bom velhinho não existia, apresentando evidências claras da inconsistência da história toda. Nessas ocasiões eu sempre via os olhares dos outros pais nos fuzilando, ou mesmo os pais querendo invalidar os fatos que ela apresentava.

Quando minha filha mais moça nasceu a mais velha já estava destruindo o mito do Papai Noel para audiências infantis fazia algum tempo. Assim eu logo percebi que com aquele ser recém-chegado ao mundo não seria possível fazer a farsa do bom velhinho. O foi um alívio, não queria mais uma vez ser a responsável por alimentar a crença em algo inexistente e ao mesmo tempo a responsável por acabar com a história toda.

Porém, quando a pequerrucha estava com 2 anos e meio veio a pandemia e com a pandemia veio toda a infurnação em casa, todo o convívio intenso familiar, a crise dos dois anos se transformou em crise dos 3, dos 4 e eu voltei a usar a frase: “Preciso mandar um whatsapp pro Papai Noel?” E dessa vez eu era plenamente apoiada pela minha filha mais velha, que parou de destruir o mito do bom velhinho, porque tudo que ela mais queria era que a irmã parasse com a birra por qualquer motivo que fosse.

Eis que esses dias eu e minhas duas rebentas estávamos assistindo Frozen e a pequena me diz: “Mamãe você poderia mandar um whatsapp para a Elza, por favor?” Eu meio distraída respondi: “Eu não tenho o número dela”. Automaticamente ela me retrucou, quase que zombando de mim: “Mamãe, você tem o número do Papai Noel!” Pega de surpresa e no contrapé, perguntei o que ela queria falar com a Elza e ela disse: “Quero convidá-la para o meu aniversário do ano que vem”. Esse era o momento exato para eu acabar com toda a farsa dos meus contatos com seres mágicos, mas o olhar da minha filha mais velha dizia para eu não fazer isso. Pelo menos, não agora faltando menos de dois meses pro natal e a nossa pequena iludida ainda não tendo voltado pro colégio. Rapidamente, emendei: “Olha minha filha, a Elza tem uma agenda complicada, tá lá lidando com a questão dos seus poderes, espíritos, tentando não congelar tudo, não sei se ela vai responder”. Seguimos vendo o filme.

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