O ano interminável

Muito tem se dito que não deveríamos adicionar 2020 à nossa idade, como se não estivesse existido, mas será? Eu, pessoalmente, passo a achar que 2020 está valendo por 10, por 100, por mil. Às vezes penso que entrei em 2020 com 39 anos e vou chegar em 2021 com 49. Não há dúvidas que este está sendo um ano intenso. Intenso pessoalmente e intenso publicamente.
Pelo lado pessoal muita coisa já aconteceu nesses primeiros 6 meses. Minha filha mais moça fez 3 anos com festinha virtual. Ensinei minha filha mais velha a multiplicar e dividir e ela sobreviveu. Tive que fazer um implante dentário do dente bem da frente porque possivelmente bati com ele, mas não me lembro quando, nem como. Dei mais de 90 aulas online, criei um blog pra não enlouquecer. Li menos que deveria, assisti e re-assisti séries. Limpei a casa incessantemente. Lavei e desinfetei tudo que adquiri. Comprei uma cama elástica para que minhas filhas não cheguem ao final da pandemia como os humanos do Wall-E. Apartei tantas brigas delas que sairei PHD em administração de conflitos. Tive vontade de me esconder numa casinha no meio do nada. Descobri que eu e minha família sobreviveríamos se precisássemos passar o resto da vida juntos em um barco (desde que tivesse internet). Chorei, ri, fiquei angustiada, odiei (bastante), fiz piada (muitas).
Na dimensão pública também foi tudo muito intenso. No Brasil temos um genocida a solta no comando do país que dá declarações absurdas e mentirosas repetidamente. Tivemos 3 ministros da saúde, 2 da justiça, 2 doidos na educação, 2 secretários lunáticos na cultura, um cachorro surrupiado pela primeira dama e apresentado como sendo da família. Passamos por uma das maiores crises econômicas, que está nos levando de volta para a década de 80. Enfrentamos individualmente uma pandemia, considerando que não há uma liderança que coordene o país nesse momento. Tivemos um aumento de mais de 40% nos índices de violência doméstica e de mais de 45 % em feminicídio, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Há hoje mais de 30 crianças sendo assassinadas por dia no Brasil, segundo a UNICEF. A taxa de desemprego está altíssima e entre as mulheres chega a ser quase 40% superior do que em relação aos homens. A desigualdade social cresce com velocidade assustadora, bem como a morte das pessoas mais pobres. Respira que não acaba aí. Tem uma nuvem de gafanhoto vindo, que uma hora vem, outra hora pensa melhor e desiste. Tivemos um ciclone que quase levou o sul do país pra Oz (talvez tivesse sido bom). Para completar não podemos nem se quer fugir daqui por que todas as nossas fronteiras estão fechadas, dá pra tentar escapar para Nárnia. Estamos recém chegando em julho, haja fôlego.
O resto do mundo teve suas tensões bélicas momentaneamente colocadas em banho maria, pois também enfrenta uma pandemia. No entanto, na maioria dos casos, os países reagem com responsabilidade e dignidade bem maior que o Brasil. Há uma coerência nas praticas de isolamento social e não se questiona as orientações da OMS. Obviamente todo mundo tem problemas, uns maiores e outros menores, mas só o Brasil tem o pior líder no combate ao coronavírus, segundo o Washington Post. Nós temos um machista, misógino, sexista, inconsequente no descomando que trata com descaso um vírus que já fez mais de 60 mil mortos oficialmente no país (sim, há as subnotificações e esse número deve ser bem maior).
Se você chegou até aqui parabéns, passou para a fase 7, do ano que vale por 10. Lá no finalzinho se a questão da pandemia já tiver se resolvido ainda teremos um problema político, social e econômico gravíssimo e se você pertence às ditas minorias (que na real são maiorias) força na peruca porque a peleia vai ser braba! Ah e antes que eu esqueça, no final do ano adicione 10 anos à sua idade original e não diga “Vem 2021”, porque dá azar. Desde de 2015 estamos dizendo isso e só piora, o melhor é fingir que está tudo bem!


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