Nosso meteoro

    

    Há uns dias atrás minha mãe me contou, um tanto indignada, que recebeu uma ligação do crematório oferecendo para ela um plano de cremação. Ela disse para o vendedor que ligou, considerar um absurdo aquela ligação, que eles estavam se aproveitando da situação mundial para tentar fazer mais vendas. Em meio a uma pandemia, em um país que vem tratando a crise como uma gripezinha, o crematório ligar para uma idosa para oferecer o dito plano, é no mínimo nada empático. Ela tem mais que ficar indignada mesmo. Acredito que o setor funerário seja um dos poucos setores da economia que esteja bem movimentado ultimamente. Considerando aquela máxima que a única certeza que temos na vida é a morte, não me parece que um crematório precise fazer marketing ativo. Eles têm todo o direito de fazer planos, vender e fazer o que bem entendem, mas ligar para idoso e todas as pessoas do grupo de risco do coronavírus, não é exatamente uma boa estratégia nesse momento. É como dizer: Boa tarde! Já que a senhora vai morrer mesmo, quem sabe faz um plano de cremação?

    Já é muito desagradável ver o presidente do seu país dizendo que você corre um risco de morrer e que tudo bem, porque afinal esse era o seu destino. É detestável saber que uma das assessoras do ministro da economia disse que a covid 19, seria boa para os cofres públicos, pois os idosos iriam morrer e desonerá-los (cofres esses com os quais eles sempre contribuíram ao pagar seus impostos e fazer mil descontos para sua dita aposentadoria).  Completando ainda temos parte da iniciativa privada, achando que tudo bem morrer uma galera, mas o importante é a economia ficar em movimento. Ao que parece nós estamos a serviços da economia e não o contrário, só não sei como a economia funciona se não tem a gente. Eu pessoalmente, tenho muita dificuldade para entender essa parte da economia não parar, porque até onde compreendo se temos uma tragédia como a que estamos vivendo, a economia para em todos os sentidos (só movimenta a parte funerária mesmo). Quem morre não consome, quem morre não trabalha, mas enfim isso deve se dar a minha imensa limitação intelectual e ao meu raciocínio esquerdopata, de que tanto me orgulho.

    Tem gente que diz que o governo trata a covid 19 como uma gripezinha por negacionismo da ciência e isso é, a meu ver, um ledo engano. O que o governo tem é um projeto eugenista e o coronavírus só veio indiretamente auxiliá-lo nesse sentido. Vai morrer idoso, vai morrer diabético, asmático, hipertenso e pessoas com outras mil e tantas doenças crônicas? Vai, mas do ponto de vista do governo brasileiro isso está bem, assim serão selecionados “os melhores e menos onerosos genes” para permanecerem na população. Claro que para isso eles também precisarão dar um jeito de matar os que pensam diferente deles: feministas, negros, comunistas, LGBTQ+, artistas, mas com um país que já enfrenta uma crise de saúde enorme, isso pode não ser tão difícil.

    O louco é que vivemos um paradoxo: a nossa tolerância deu espaço para a intolerância deles e agora precisamos não tolerar mais. Corremos risco todos nós. Digo nós: eu, você que me lê  (um bolsominion teria parado na segunda linha), minhas filhas, minha mãe, meu marido, meus amigos, um monte de gente que amo e um monte de gente que nem conheço, mas que me doeria muito saber que morreram pelo que pensam, pela sua cor, pela sua orientação sexual ou pela doença crônica que têm.

    Às vezes fico pensando como seria o Brasil “deles”, sem a gente. Nossa! Seria muito louco! Imagino que andariam todos juntinhos para não cair na borda da terra plana. Tomariam muita água tônica para não pegar o covid 19. As escolas não seriam mais mistas. As das meninas seriam rosas, as dos meninos seriam azuis. As crianças aprenderiam que viemos da costela de Adão. Um ministro da educação com sérios problemas de alfabetização seria responsável por uma reforma ortográfica. Todos teriam histórico de atleta e fariam flexões tal qual seu líder. As mulheres pareceriam ter saído daquelas revistas da década de 50. Estariam sempre à disposição de seus maridos e seus maiores desejos seriam um aspirador novo e uma batedeira planetária. Na área das artes o grande destaque seriam os panos de prato pintados com dizeres bíblicos. A população teria eloquência semelhante a de um filho de presidente. As autoridades se auto homenageariam por motivos débeis com medalhas de nióbio. Agrotóxico tomariam de canundinho e de quebra derrubariam aquele monte de árvore da Amazônia que não serve pra nada, no lugar criariam rebanhos de gado. Pronto! Em menos de 6 meses eles teriam acabado com o planeta! 

    Esse cenário hipotético (considerando só o Brasil) me leva a concluir que se os dinossauros foram extintos por um meteoro, o nosso meteoro já chegou na terra faz tempo chama-se extrema direita. Temos exemplares dele espalhados por todos os continentes e se não agirmos conjuntamente agora, talvez seja tarde. 

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